terça-feira, outubro 15, 2024
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    Animais atingidos por incêndios: Saiba como os bichos são resgatados e cuidados

    Com prejuízos incalculáveis para o meio ambiente, as queimadas que atingem as florestas em diferentes regiões do país também causam estragos para a vida animal. Além das mortes, que são o maior risco — nas queimadas de 2020 no Pantanal, a estimativa é de que cerca de 17 milhões de animais vertebrados tenham morrido —, o fogo pode causar diversos outros problemas para os que ficam.

    Muitos conseguem sobreviver — pelo menos por um tempo —, mas a um alto custo. Eles precisam lidar com queimaduras, inalação de fumaça, dificuldade para encontrar alimento na terra arrasada pelo fogo e os que conseguem fugir para outras áreas ainda precisam competir com populações que já estão estabelecidas, explica o biólogo e diretor no SOS Pantanal, Gustavo Figueirôa: “É um efeito cascata”.

    Mais a longo prazo, segundo a professora Líria Hirano da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília (UnB), os animais também podem sofrer com o emagrecimento e a desidratação por falta de recursos alimentares e hídricos.

    “O desenvolvimento de doenças respiratórias crônicas e de infecções secundárias, as lesões causadas pelo fogo ou pela queda de imunidade decorrente do estresse sofrido durante os incêndios”, avalia.

    Em Brasília, as chamas tomaram conta do Parque Nacional por quase uma semana. Dois dias depois do início do incêndio (17 de setembro), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) começou a fazer o monitoramento da fauna com uma equipe formada por profissionais do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação em Biodiversidade e Restauração Ecológica, da Coordenação de Manejo Integrado do Fogo e do Jardim Zoológico de Brasília.

    Nesse monitoramento, duas antas foram resgatadas e uma delas não resistiu. Na necropsia, detectou-se muita alteração no sistema respiratório, provavelmente devido à inalação de fumaça.

    Anta resgatada em Brasília | Foto: Reprodução

    No entanto, os ferimentos eram de um ataque de um cachorro sofrido pela anta na região próxima à unidade de conservação. Segundo a chefe do parque, Larissa Diehl, a presença de cães e gatos é uma das principais ameaças à fauna nativa do Cerrado, ainda mais nesse período.

    “A situação fica ainda mais grave quando há incêndio, já que as antas estão saindo do território delas, que está afetado pelo fogo, e indo para áreas não queimadas. Quando migram de área, elas ficam mais suscetíveis a ataques de cães. Os filhotes, mais indefesos, viram presas fáceis para as matilhas de cães. Mesmo acompanhados de adultos, os animais silvestres ficam em desvantagem quando confrontados por matilhas”, explica.

    Outros casos
    Esse é apenas um dos casos de animais vítimas do fogo. No Pantanal, um filhote de macaco-prego foi resgatado no último dia 13, em meio às cinzas, na região chamada de Salobra, em Miranda, no Pantanal sul-mato-grossense. O bebê, socorrido por equipes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ainda estava com o cordão umbilical e foi levado para o Hospital Veterinário Ayty, no Centro de Recuperação de Animais Silvestres (CRAS), em Campo Grande.

    Filhote de macaco-prego | Foto: Divulgação/Governo do MS

    No mês passado, também no Pantanal, uma onça-pintada com queimaduras nas patas foi encontrada na mesma cidade. A fêmea, de dois anos, foi avistada mancando por moradores e resgatada dentro de uma manilha, em uma área rural. O animal foi sedado e levado para o mesmo hospital que o macaco-prego, em Campo Grande.

    Além da onça Miranda, o CRAS também cuida de um filhote de veado-catingueiro, resgatado durante incêndio florestal na Aldeia Alves de Barros, entre Bodoquena e Bonito. “Órfão do fogo”, já que foi achado sozinho, ele será acompanhado pelos veterinários até a fase adulta, quando deve ter capacidade de ser solto.

    Filhote de veado | Foto: Álvaro Rezende/Governo de MS

    O Instituto Nex trata e abriga onças feridas ou sob ameaça. O maior felino das Américas, extinta nos Estados Unidos, ainda pode ser encontrado no Brasil mas situação é crítica.

    A ONG fica em Corumbá, em Goiás, a 80 km de Brasília, e existe há mais de 24 anos. A veterinária Pollyanna Motinha é uma dos responsáveis técnicos do local e explica que os animais são direcionados por órgãos ambientais, como o Ibama.

    “O Nex recebe animais em várias condições, animais que são saudáveis, mas que não têm destinação, animais que têm sequelas de maus-tratos ou de caçadores, e animais que precisam ser tratados e depois reintroduzidos na natureza”, explica.

    Em 2020, durante as queimadas no Pantanal, duas onças — Manassi e Ousado — resgatadas em meio às chamas e levadas para o Nex. A veterinária contou que Ousado se recuperou 100% e voltou para o seu habitat natural. Já Manassi não pôde voltar para a natureza. “As lesões dela eram tão graves que ela perdeu a capacidade de expor as garras, então permanece com a gente no Nex”, conta.

    Neste ano, foi a vez da onça batizada de Itapira receber os cuidados dos veterinários do instituto e ela já está totalmente recuperada. “A gente está esperando a região onde ela estava ficar mais segura para voltar com ela para a natureza”, afirma a veterinária.

    Onça Itapira | Foto: Reprodução/Instituto Nex

    Itapira é uma onça do Pantanal do Mato Grosso do Sul que morava em uma fazenda que foi 80% atingida pelo fogo. Após ser avistada com as patinhas queimadas. Os veterinários responsáveis pela fazenda resgataram o animal e começaram o tratamento ainda no Pantanal. Como a onça não respondeu bem aos tratamentos, ela foi levada para o Nex.

    Foto: Divulgação/Governo de MS

    Pollyanna diz que a principal dificuldade de trabalhar com esses animais é o tamanho e a necessidade de anestesiá-los em todos os procedimentos, além dos curativos que demandam bastante tempo e experiência.

    Mais vulneráveis
    O fogo pode afetar diferentes espécies, inclusive com ferimentos graves. De acordo com a professora Líria, as mais afetadas vão depender da característica da área atingida e da biodiversidade da fauna local, mas no geral as aves que voam podem se deslocar mais facilmente durante os incêndios. Enquanto os répteis, como os lagartos e as serpentes, e os anfíbios têm mais dificuldade de se locomover e acabam sendo as vítimas mais frequentes.

    Líria explica porque os filhotes são frequentemente resgatados. “As fêmeas, muitas vezes, deixam os filhotes na toca em busca de alimento e não conseguem retornar devido ao fogo. Às vezes, a mãe está fugindo e morre no caminho, mas o filhote consegue continuar, e alguns animais protegem o filhote por mais tempo o carregando nas costas”, explica.

    Gustavo Figueirôa acrescenta ainda os mamíferos mais lentos, como os tamanduás e antas, entre os mais vulneráveis em casos de incêndio, e ressalta que a depender da intensidade do fogo, muitas aves também acabam morrendo.

    Risco para humanos
    Quando esses animais fogem das áreas de floresta por causa do fogo, eles podem chegar a lugares que não oferecem condições de vida adequadas. Além do sofrimento enfrentado por eles, caso a região seja uma área urbana ou nas redondezas, com movimento de pessoas, os humanos também correm riscos, inclusive de sofrer ataques.

    Outros riscos são as doenças zoonóticas, transmitida entre pessoas e animais, que também são um perigo potencial em caso de contato mais próximo, acrescenta a professora da UnB. Portanto, o manejo e a manipulação de animais silvestres devem ser feitos somente por profissionais capacitados.

    A orientação para quem encontrar animais assim em áreas urbanas é sempre ligar para os órgãos competentes como os bombeiros, secretaria de meio ambiente do estado ou município ou qualquer força pública para realizar o resgate adequado dos animais, quando será encaminhado para uma unidade veterinária especializada, tratados e após os cuidados, será avaliado se ele tem condições de ser devolvido à natureza.

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