Por Mario Sabino
Acordo neste domingo sufocante de calor e me deparo com o ex-ministro da Fazenda tucano Pedro Malan evocando a petista Dilma Rousseff em artigo publicado no Estadão. Confesso que, diante do embaralhamento de posições no quadro político-econômico, já não sei dizer se há certa ironia na lembrança de Pedro Malan. Mesmo que haja, contudo, ela é encoberta pelo pensamento positivo em que a lembrança se insere. O ex-ministro está em busca de “convergências possíveis” entre quem quer o Estado gastando o que não pode e quem quer o Estado economizando no que pode.
Pedro Malan cita uma fala de Dilma Rousseff, em entrevista coletiva que a então presidente da República concedeu em 2014. Disse ela:
“‘Ao longo do governo, você descobre que várias coisas estão desajustadas. Várias contas que podem ser reduzidas, (…) o que vamos tentar é um processo de ajuste em todas as contas do governo, vamos revisitar cada uma e olhar com lupa o que dá para reduzir, o que dá para tirar’. Surpreendente declaração para alguém que naquele momento já vinha de cinco anos à frente da Casa Civil e quase quatro anos como presidente da República. Mas a sugestão de Dilma, ainda que nunca implementada, permanece relevante para o governo recém-eleito, que não deveria desperdiçar a oportunidade sugerida ao longo dos seus próximos quatro anos. E transformando o tema em política permanente.”
Ao longo do governo de Dilma Rousseff, o que ela fez foi cometer uma fraude gigantesca, a fim de maquiar o desastre fiscal que havia causado com a sua “nova matriz econômica” e, assim, conseguir a reeleição. O resultado foi uma da piores recessões econômicas já experimentadas pelo país — e que a maioria dos brasileiros já esqueceu.
As “convergências possíveis” de Pedro Malan partem do pressuposto de que, sim, é preciso mesmo, de vez em quando, aumentar os gastos públicos, para fazer frente às necessidades sociais e também para estimular a economia e coisa e tal. Mas que também dá para controlar os gastos públicos e coisa e tal, vamos deixar a ideologia de lado, por favor, e salta mais um chopp. Para ilustrar o seu ponto, depois de citar Dilma Rousseff, ele faz referência ao ex-primeiro-ministro da Espanha Felipe González, flor da social-democracia europeia, que costumava afirmar: “O grande problema da ideologia é que ela obscurece o debate de ideias sobre a ação do poder público, ao tratar como grandes questões políticas e morais problemas específicos que deveriam ser enfrentados como questões de eficiência do setor público, quando não há diferenças de vulto sobre os objetivos a alcançar, e sim sobre as formas mais eficazes de fazê-lo”.
Como está longe de ser besta, Pedro Malan não diz, no título do artigo, que as convergências são possíveis. Ele faz um pergunta: “convergências possíveis?”.
A resposta para o ser-e-não-ser-tudo-ao-mesmo-tempo-agora do ex-ministro se encontra no próprio Estadão. Em editorial, o jornal critica o fato de os petistas quererem conservar a todo custo — e bota custo nisso, digo eu — o controle sobre a gestão do Bolsa Família, para “manter a sua freguesia cativa nas regiões mais pobres do país”. Daí a resistência ao nome de Simone Tebet para ministra da Cidadania, pasta que se ocupa de dar dinheiro aos necessitados. Páginas adiante, uma reportagem mostra como os sindicalistas de resultados, colchão do berço político do PT (o lençol são os tais movimentos sociais), querem “reorganizar o seu custeio”.
Como está muito calor, sejamos breves, Pedro Malan, porque a coisa toda é simples de ser entendida: não dá para matar a fome dos pobres com a vontade de comer do PT e de toda essa gente que quer salvar o Brasil. Só no curto prazo eleitoreiro. A tunga de dinheiro público é a única matriz econômica nacional. Quanto mais cumbuca estatal, melhor para meter a mão.