Com o crescimento das chamadas bets e os gastos da população com essas operações, o Congresso teve uma explosão de propostas legislativas apresentadas sobre apostas online. Entre 2022 e 2024, deputados e senadores protocolaram ao menos 39 projetos de lei sobre o assunto.
Entre as principais medidas sugeridas, estão a proibição dos recursos de benefícios sociais, como o Bolsa Família, para apostar online — beneficiários do programa transferiram R$ 3 bilhões às empresas de apostas por meio de Pix em agosto deste ano, segundo dados do Banco Central (BC).
Desde a divulgação do dado, foram apresentados oito projetos para limitar ou proibir apostadores inscritos no Cadastro Único do governo para o pagamento de benefícios sociais.
“Congresso errou”
Um dos primeiros congressistas a propor a restrição do uso de cartões de créditos e de contas do Bolsa Família para apostas, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) diz que as bets estão “endividando famílias e comprometendo o consumo”.
Ele também avalia que o Congresso errou ao não regulamentar as regras para as restrições de publicidade das apostas online. “Tínhamos que ter aprovado a lei e a regulamentação da propaganda”, disse
Parte dos projetos apresentados no Congresso proíbe publicidade de casas de apostas e impõe regras para que influenciadores digitais façam propagandas de plataformas do setor.
É o caso de propostas protocoladas por Lopes e pelo líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), que propõem a proibição de propagandas. Na mesma linha, a presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), também propôs vedar as propagandas de bets.
Influenciadores
Na última semana, a participação de influenciadores nas publicidades dessas empresas ganhou repercussão após a advogada e influenciadora Deolane Bezerra ser presa durante uma investigação que tinha objetivo de coibir crimes de lavagem de dinheiro e prática de jogos ilegais. Ela deixou a Colônia Penal Feminina de Buíque, no agreste de Pernambuco, na última terça-feira (24), após decisão judicial.
A discussão sobre as chamadas bets se intensificou em 2023, depois que o Congresso aprovou e o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou uma lei que regulamenta as apostas online no Brasil. A lei original, que permite as apostas de quota fixa, na modalidade de aposta esportiva, é de 2018.
Nesta semana, por causa das consequências no superendividamento das famílias, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) apresentou uma ação ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que a Corte declare inconstitucional a lei que regulamenta as apostas esportivas online.
No Congresso, os deputados e senadores também apresentaram propostas relacionadas à: prevenção à ludopatia, o vício em jogos,
e obrigação de aviso de advertência em publicidades relacionadas à loteria de apostas.
A maioria (75%) dos projetos para mudar as regras das apostas no país foi apresentada neste ano, mesmo com as normas de regulamentação já elaboradas pelo governo. Dos textos sugeridos, 30 estão na Câmara e nove no Senado.
Governo se mobiliza
Em janeiro, o governo criou a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA). Neste ano, uma série de portarias foi publicada pelo Ministério da Fazenda para criar diretrizes para o funcionamento dessas empresas no Brasil. No entanto, alguns pontos ainda não foram regulamentados.
Na semana passada, ante as reações e pressão de congressistas, o Ministério da Fazenda publicou nova portaria sobre o funcionamento de bets no país. Pela norma, as bets que ainda não solicitaram autorização de funcionamento terão suas operações suspensas a partir de 1º de outubro.
O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, afirmou que as apostas se tornaram um “problema social grave” e, por isso, será feito um “pente-fino” com a regulamentação. Uma das propostas do Executivo é limitar o pagamento de apostas com cartão de crédito.
Em nota, o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, afirmou que vai acompanhar a regulamentação das bets e “encontrar mecanismos para evitar que dinheiro dos benefícios sociais sejam utilizados em jogos”.
Oposição critica
Grupos de oposição ao governo Lula criticam a regulamentação das bets por meio das portarias publicadas. Na avaliação de alguns congressistas, apesar de aumentar a arrecadação dos cofres públicos por meio de impostos, a regulamentação do setor causa impactos negativos na renda e na saúde dos brasileiros.
Nesta quinta-feira (26), a Frente Parlamentar Evangélica, que reúne mais de 200 congressistas, divulgou uma nota sobre o assunto. “Precisamos retirar do mercado empresas que se aproveitam da fragilidade econômica e social dos brasileiros, muitas vezes utilizando estratégias de marketing agressivas e enganosas”.
Integrantes da oposição também se mobilizam para barrar a votação do projeto que autoriza o funcionamento de bingos, cassinos e jogo do bicho no Brasil. O projeto já foi aprovado na Câmara e aguarda votação no plenário do Senado.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) afirmou que, se aprovado, o projeto que trata sobre bingos e cassinos vai piorar o cenário de vício em jogos de azar. Girão é autor de três propostas que proíbem a publicidade de casas de apostas e obrigam a exposição de advertências sobre os riscos desses jogos.
“É uma tragédia anunciada”, disse o senador. “Eu mesmo subi à tribuna várias vezes denunciando, alertando sobre tudo isso que ia acontecer com relação às bets. Será pior se for para frente o projeto que está na boca para ser votado, sobre bingos e cassinos. Espero que essa tragédia que aconteceu, de alguma forma, sirva de lição. Acredito que o Congresso tenha que acabar com isso”.